domingo, 26 de março de 2017

“Que coincidência!”

Quando eu tinha uns dez, onze anos, comecei a perceber que as meninas realmente são diferentes.
De repente, do nada, eu me encantava por alguma.
Não era namoro, coisa mais séria; apenas uma atração que vinha não sei de onde (aliás, agora sei!).
Nessa idade eu passava férias e feriados no Hotel das Cigarras, em São Sebastião.
Era um hotel plano com os apartamentos espalhados e uma linda piscina e bar bem no centro.
Para ir de um lado para o outro existiam escadas e rampas que passavam por várias partes: recepção, sala de jogos, carteado, restaurante. Era quase um labirinto para uma criança.
Nas férias conheci e me encantei por uma loirinha e conversávamos muito.
Com o passar dos dias conheci sua rotina.
Lá pelas nove, quase britanicamente, apesar de família Italiana, ela saia com os pais do apartamento da ala Amarela, subia uma rampa que passava ao lado da sala de jogos.
Eu sempre acordava bem cedo, tomava meu café da manhã que era servido ao lado da piscina e ficava perambulando pelos caminhos do hotel.
Perto das nove, eu estrategicamente ia para perto da sala de jogos e como se fosse uma coincidência, encontrava a família a caminho da piscina.
“Que coincidencia!”
Sua mãe, muito gentil, me convidava para acompanhá-los.
E eu ia, claro!
Anos mais tarde, já adulto, sua mãe me contou:
“Você ficava esperando a gente passar para ir tomar café junto!”
Pensei que eu sabia disfarçar...
Na mesma época, no Liceu Eduardo Prado (minha escola... aliás, do meu pai!), conheci um menina que era a sensação do Vocacional.
Eu fazia o quarto ano primário e ela o Ginásio Vocacional.
Meu horário de saída era 17 horas, e o dela 17:50.
Com o tempo percebi que ela ia até a esquina da Mario Ferraz com Tabapuã e sentava no murinho da casa vizinha ao bar e lá esperava sua condução.
Eu calculava o horário e depois que a “sirene” do Vocacional soava, saia pela porta exclusiva dos professores e funcionários na Rua Jacurici (já que a partir das 17:01 eu deixava de ser “aluno” e passava a ser “morador” do prédio), virava à direita na Mario Ferraz e ia em direção à Tabapuã.
Quando chegava, que coincidência! Lá estava a garota.
De avental branco, uniforme do Vocacional, me dava o prazer de uma conversa de dez, quinze e às vezes para minha sorte, vinte minutos.
Certa vez, perdi a hora, e sai correndo para chegar ao quinto andar, pois já era quase sete, horário determinado pelo Macedão para o jantar... e ai de quem não chegasse na hora!
Anos mais tarde, depois de freqüentar o Ginásio (Vocacional) e o Cientifico, já com idade de adulto, mas cabeça de adolescente, entrei na Faculdade de Arquitetura em Mogi das Cruzes e para lá me deslocava de ônibus.
Estudava no período Vespertino e tomava a condução em frente ao Shopping Iguatemi.
O ônibus passava pelo Pacaembu, onde pegava mais colegas.
Às vezes ia de carro até a frente do estádio, estacionava-o lá e pegava o “busão”.
Oficialmente era para facilitar as coisas na volta. Eu descia lá, pegava o carro e chegava em casa bem mais cedo.
Porém, algumas vezes, era uma artimanha para ver rapidamente um “broto” por quem fiquei caidinho e havia passado para o período matutino.
Ela chegava, descia, e eu estava lá absorto, como se não quisesse nada, esperando minha condução para o sentido contrário.
Era como na musica “Sinal fechado”, de Paulinho da Viola:
“Olá! Como vai?
Eu vou indo e você, tudo bem?
Tudo bem, eu vou indo, correndo pegar meu lugar no futuro... “
Aliás, eu indo... e ela voltando...
Tudo rapidamente, um beijinho e tchau...
Só faltava eu falar:
“Que coincidência!”


Nas fotos: Primeira, a piscina das Cigarras e o bar onde se tomava o café da manhã.
Segunda, a menina da esquina, de avental do Vocacional, numa foto que minha timidez só permitiu ser batida de longe.
Terceira, no começo da avenida Pacaembu (no alto da foto), a pracinha onde deixávamos o carro e pegávamos o ônibus para Mogi, e claro, via rapidamente minha amiga.

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